Divisórias acartonadas
- Sylvio Rocha Nogueira
- postou em Sáb, 14 Nov 2009, 23:26
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Impossível negar que as divisórias de gesso acartonado vieram para ficar, pois suas características e virtudes - funcionais ou estéticas - são várias e inquestionáveis. Alem disto, os fabricantes, no Brasil, vem praticando detalhes capazes de conferir razoável isolamento acústico, suficiente estanqueidade em pisos úmidos, bem como reforços localizados, "inserts", buchas especiais, etc, que permitem suportar cargas mais frequentes. E, para tanto, declararam-se dispostos a investir na elaboração de Normas Brasileiras Registradas (NBRs) que deverão, até o ano de 2011 – devidamente homologadas pelo no INMETRO / CONMETRO / ABNT, de modo a permitir eventuais reclamações, dos consumidores, com base no C.D.C. - abranger todas as fases construtivas posteriores ao fornecimento de chapas de gesso e perfis metálicos (únicos insumos até hoje cobertos por Normas Brasileiras Registradas), tais como parafusos, reforços ocultos de madeira, corretos embutimentos de dutos hidráulicos ou elétricos, isolamentos térmicos e acústicos envelopados, fitas vedantes, impermeabilizantes, pinturas, etc, conforme matéria publicada na conceituada revista Tèchne, Edição 107, Página 42, de 14.02.2006.
Assim, embora o horizonte de 2011 seja de nula serventia para os primeiros adquirentes (1991) e para os atuais moradores/usuários de imóveis já guarnecidos com o produto, é positivo o empenho, dos fabricantes do sistema (chapas de gesso + perfis de aço), em avançar rumo à minimização de danos ou prejuízos ao consumidor; tendo-se, ademais, como básico pressuposto, que tal e longo período probatório - iniciado, no Brasil, há 18 anos – esteja sendo atentamente acompanhado pelas comunidades acadêmica e científica, bem como por autoridades sanitárias, ambientais, parlamentares e jurídicas do país.
Contudo - como ocorre com muitos excelentes remédios -, o produto apresenta potenciais vulnerabilidades ou riscos que deveriam ser (e não têm sido) comunicados aos cidadãos usuários e adquirentes de imóveis, residenciais e comerciais, nas grandes e médias cidades brasileiras.
Assim, para melhor conhecimento de profissionais do ramo e/ou de Entidades públicas eventualmente envolvidos, cumpre comentar :
1º - O consumidor final não está sendo alertado sobre o potente estímulo à proliferação de insetos (principalmente traças, formigas, cupins, pulgas e baratas) e artrópodes, nos vazios dos painéis, onde o farto e seguro abrigo (células intercomunicáveis na horizontal e/ou via forros em “plenum”) alia-se a componente comestível das paredes (papelão). Os ocos e interligados painéis das "drywall" somam-se, pois, às antigas "cavernas" formadas por tapamentos de prumadas (de água ou esgotos) com paredes de alvenaria, que sempre foram, e ainda são – na construção convencional –, abrigos para colônias de formigas e outros vetores.
2º - Assim, embora seja total absurdo dizer que as divisórias acartonadas “inauguraram” os primeiros vazios e reproduções, urbanas, de insetos ou artrópodes, será muito ingênuo não perceber que - com seu uso - a multiplicação desses vazios resulta fortemente ampliada, principalmente em imóveis residenciais, onde há odores, fartos, gerados por alimentos, escamações de pele, resíduos de ração animal, roupas, malas, calçados, etc. Há, além disto, casos como o de Curitiba, onde tal incremento de vazios construtivos inclui aqueles nos quais já abriga-se e reproduz-se a aranha marrom, convertida em sério problema de saúde municipal: em 2003 foram atendidas, nas Unidades de Saúde, mais de 3.000 pessoas picadas; ou seja: um elevado índice de quase 2 (dois) casos para cada 1000 habitantes. Sucede que essa aranha é onívora, pois caça e alimenta-se de quaisquer dos insetos citados no parágrafo anterior; e de cujas infestações ou colônias buscará proximidade que permita cômodo suporte, alimentar, à procriação.
3º - Sobre guarnições de portas, em tais divisórias, cabe dizer que essas saem, de fábrica, suficientemente imunizadas. Contudo, durante as montagens, artífices vários ou imperitos empreiteiros costumam inserir (e ocultar) uma profusão de barrotes, sarrafos ou pedaços de tábuas - sem qualquer tratamento imunizante - para fixar tubos, caixas de descarga, aparelhos sanitários, quadros de luz e de telefonia, eletrodutos, tomadas, interruptores, extintores, aquecedores, etc. O desavisado consumidor, com a obra pronta, jamais saberá o real volume desses “bacalhaus”, que podem servir à nutrição e proliferação de vários insetos (ênfase para cupins); como nunca saberá, também, se fiações várias, transitando pelos vazios e forros falsos, estão embutidas em eletrodutos, se há isolamento com fibra-de-vidro solta (não envelopada) soltando partículas, etc, etc.
4º - O discurso (praticado pelos fabricantes nacionais do produto) sobre o amplo e consagrado uso dessa divisória, no exterior - principalmente na Europa e nos EUA -, esbarra em três primários contra-argumentos :
A ) A divisória de gesso acartonado, na América do Norte, é a “milésima” convidada para um "baile" que dura há muitas décadas, pois é sabido que parte dominante das moradias norte-americanas é erguida em madeira ou com "frames" associados a outros materiais (aço, alumínio, fibras sintéticas, poliestireno expandido, etc). Acontece que o amplo uso de paredes ocas criou e consagrou, naquela região, a já antiga e muito sólida atividade do "pest-control": significa dizer que qualquer povoado, nos EUA ou no Canadá, possui (além de gélidos invernos, que eliminam enormes quantidades de indesejáveis vetores) várias empresas especializadas no combate a insetos e fungos (que procriam ou apenas abrigam-se nos vazios), sendo que algumas chegam aos requintes de exterminar, ninhos ou colônias, com gases venenosos, nitrogênio líquido, injeções de boratos (muitos construtores deixam, dentro das divisórias, tubos perfurados e conectados a válvulas de tampa retrátil) e, até, de usar estetoscópios digitais e aparelhos, portáteis, de micro-ondas !...
B ) Apesar dessa neoparafernália (muito onerosa para os consumidores, que arcam com verdadeiros “planos de saúde prediais"), as infestações observadas na Califórnia, Texas, Flórida e Luisiânia (estados americanos mais quentes e/ou úmidos) já converteram-se em dispendiosas endemias, forçando os governos a manter programas de orientação, assistência e, até, de subvenções aos cidadãos, para os quais destinam vultosas verbas; quem duvidar, e puder navegar na Internet, tente um bom site de busca (”Google” ou assemelhado) e use parâmetros como "USA"; "pest control", ou associações de "drywall” com “mold”, ”silverfish", ”termites", ”insects", “bugs”, “ants”, “roaches”, “spiders”, “brown recluse”, etc. ( digitar: “drywall” ; “segundo parâmetro” )
Nota: Quem desejar conhecer dados, do estrangeiro, sobre outros relevantes riscos inerentes ao produto, poderá usar este link :
http://www.lafargenorthamerica.com/wps/wcm/resources/file/ebf97207c0ef033/Drywall%20MSDS%20SP%202011.pdf
C) O que dizer, portanto, do consumidor brasileiro, habitante de um país cujo clima (na média) faria da Flórida um "freezer" ?... Resta alguma dúvida sobre o enorme estímulo reprodutor que os vazios dessas divisórias representam para cupins, formigas, percevejos, traças, aranhas marrons e outros nocivos "vetores", em nosso cálido país ?... Conseguirá nosso cidadão comum "dedetizar" os amplos e inacessíveis vazios das "drywall", num Brasil sem qualquer tradição nesse nível de "pest control" ? Não seria, esta, uma característica a ser revelada, sempre, a arquitetos, engenheiros civis, construtores, decoradores, proprietários de consultórios, clínicas ou hospitais, mutuários da habitação popular e consumidores finais ( usuários ) de imóveis ?
5º - O meio técnico vem sendo alvo, das fabricantes de "drywall", tanto em respeitadas publicações (anúncios, artigos ou manuais técnicos, assinados por renomados profissionais e professores universitários, além de mecenatos presentes em cursos de graduação, mestrado e doutorado) como nos mais recentes partidos de cálculo estrutural (banimento de vigas + lajes-cogumelo + lajes protendidas + contrapisos "zero", etc), com o objetivo (empresarialmente legítimo!) de estimular vendas de forros compostos com produto correlato, para fáceis trânsitos de dutos (eletricidade, telefonia, lógica, água potável, etc). Esses recentes projetos estruturais (objetos de NBRs - Normas Brasileiras Registradas), embora não apresentem qualquer risco para a essencial estabilidade predial, tendem a gerar deformações lentas mais acentuadas e, na seqüência, mais fissuras em alvenarias periféricas – e em junções, destas, com as “drywall” internas -, aumentando riscos de penetrações de insetos e de infiltrações pluviais, além de elevar, também, riscos de insalubridades internas (umidade+fungos+bolores), descolamentos de revestimentos por perda de cales e, até, de corrosões em armaduras.
(Nota: sobre plasticidade e deformabilidade, das recentes estruturas de concreto armado, recomenda-se consultar incontestável entrevista do respeitado e insuspeito Prof. Engº Fernando Henrique Sabbatini, na renomada revista Tèchne, edição 99, página 24, em junho de 2005)
6º - Os produtores das ”drywall” buscam minimizar o forte risco de conversão, dos amplos e disseminados vazios (das divisórias e dos forros ) em abrigos para vetores patogênicos/peçonhentos, alegando que “os materiais envolvidos – perfis metálicos, chapas de gesso, parafusos, fitas isolantes, mantas de fibra de vidro ou lã de rocha, e afins - não atraem insetos nem serão, por eles, devorados“ (sic). Ora, como o real risco de infestação reside na farta oferta de vazios e não nos elementos que os formam, tal argumento resultaria apenas ingênuo, caso não fosse, como aqui se percebe, insultuoso à mais rudimentar inteligência.
A omissão dessas questões, desde projetos até obras e pesquisas de pós-ocupação - notadamente por Entidades envolvidas com moradias populares, ministérios, universidades, bem com por conselhos profissionais vinculados à arquitetura, à construção civil, à Saúde Pública e ao Meio Ambiente -, constitui postura incompreensível, seja sob o enfoque ético da óbvia desinformação existente, seja pela necessidade de preservar a essencial higiene (mínima salubridade) das edificações residenciais e públicas.
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Sylvio Nogueira Arquiteto
CREA 347-D/RJ – UFRJ/1966
www.snogueira.com